domingo, 9 de agosto de 2009

Les portugaises

Já era de noite quando subiu para a camioneta e se escondeu entre caixas e sacos cheios de mar. Iriam ser várias horas de viagem até à fronteira do Caia. O condutor tinha-lhe dito que podia fumar um cigarrito, mas só um cigarrito para afastar a saudade e depois bico calado até que ele, ou a GNR, e aí é que era um caso sério, lhe viessem dizer para esticar as pernas. Com esta preocupação e medo lá se acomodou o melhor que pode no meio daquelas ostras que iam, como ele, para França. Receoso do futuro mas seguro da decisão tomada, entre o sono e a vigília, lá ia naquela penumbra impregnado de cheiro a mar português com solavancos em forma de onda. Acordou com o camião parado, rasgos de luz das lanternas cruzavam o escuro, vozes autoritárias comandavam monossílabos. Fez-se dentro dele um enorme silêncio de batida acelerada de coração. Finalmente o camião lá se pôs em marcha. O resto da viagem não tem história. Quando chegaram a Paris e durante a descarga só ouvia a frase: V’lá les portugaises! Só muito mais tarde percebeu que falavam das ostras.

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